A Águia e o Dragão - acerca do recente encontro China-Estados Unidos
O encontro entre os presidentes chinês Ju Hintao e norte-americano George W Bush deu-se recentemente, a meio de uma encruzilhada histórica. Faz um terço de século que Richard Nixon foi o primeiro presidente norte-americano a visitar a República Popular da China com a qual se iniciava o fim do isolamento internacional chinês. Daqui por mais outro quarto de século estima-se que a China ultrapassará os EUA como a primeira economia do mundo. Na sua relação, a China e os Estados Unidos, esforçam-se por manter um tratamento cordial, que favoreça ambos. Mas, sem dúvida, a perspectiva histórica levá-los-á até à confrontação. A China que Clinton considerava como seu sócio estratégico já é considerada por Bush como um competidor estratégico.
No modelo comunista tradicional o dinheiro não é tanto um valor que serve para gerar lucro e capital, mas permanece apenas um meio de contabilidade e de aquisição de produtos indispensáveis. Lá, as empresas são do Estado e estão sujeitas a um plano e os directores não podem ser donos das empresas mas apenas seus administradores. A China, sem dúvida, criou um novo modelo que combina o antigo sistema herdado de Mao e Estaline, com elementos de livre empreendorismo. A empresa privada, que estava impossibilitada de prosperar na antiga União Soviética, tem agora bons alicerces e o capital estrangeiro é benvindo. Para os comunistas chineses, os soviéticos enganaram-se quando quiseram liberalizar a politica primeiro e depois a economia, enquanto eles começaram pela segunda e planeiam manter o partido único que garante estabilidade económica e social e evita explosões sociais como as que destruíram a URSS. A China emerge como um novo poder mundial, ao mesmo tempo distinto das potências da Europa e do Japão, pois não se baseia no capitalismo liberal, nem no sistema da antiga URSS pois aceita e incentiva o mercado privado. Durante a guerra fria entre Washington e Moscovo, a politica externa soviética sustentava-se em fomentar e apoiar partidos comunistas e guerrilhas de libertação nacional. A diplomacia chinesa, em mudanza, é distinta. Pequim não dá importância à promoção de partidos comunistas locais nem a forças aliadas em outros países, respentando, e bem, o direito de não ingerência nas politicas internas de cada país. Não se centra em promover os direitos sociais por que antes o Kremlin pugnava, nem os direitos humanos que a Casa Branca apregoa. Simplesmente se baseia naquilo que convem mais aos seus interesses comerciais. Por isso Hu Jintao mal chega aos EUA reúne-se com os magnatas da Microsoft, Boeing e da Starbucks e a China tem relações com países que Bush quis afastar pela sua conduta não democrática, tais como o Zimbabwe, Sudão ou a Birmânia. Pior ainda para Washington, Pequim tem um relacionamento excelente com as novas potências nucleares que os EUA temem, como o Irão e a Coreia do Norte. O avanço chinês faz-se sentir em zonas onde antes Pequim tinha pouca influência: em África e na América Latina. No continente negro a China controla 40% do petróleo sudanês e está a investir mais de U$2000 milhões de dólares no ouro negro nigeriano. Na Venezuela os chineses investem U$1000 milhões que ajudam Chavez a manter uma atitude mais desafiadora perante Bush. A China potenciou o seu comércio com o Peru, Chile e com o Mercosul de onde provêem as matérias primas que em troca recebem investimentos e produtos manufacturados. A penetração chinesa é algo que vem sendo utilizado por Lula, Bachelet e Castro como contrabalanço perante os EUA. É algo que será também usado por qualquer novo governo de centro esquerda sul-americano (no Peru, seja o próximo presidente Garcia ou Humala). A nível imediato a China não é o adversário principal dos Estados Unidos. Não chegou a ser aquilo que a URSS foi até há 15 anos quando perdeu a guerra-fria. O inimigo principal é o terrorismo islâmico e na luta contra Bush quer aumentar a sua força interna e internacional e controlar os poços de petróleo do Médio Oriente. Pequim não apoiou as guerras contra o Iraque e Afeganistão. E bem, tem andado a ajudar o Irão tirando proveito de Washington andar distraído e desgastado por elas, para avançar internacionalmente melhorando as suas relações com o Japão, Rússia, União Europeia, África do Sul, nações Árabes, Índia e América Latina. Os Estados Unidos mantêm no entanto a mira dos canhões apontada para a China. Por um lado saúdam a abertura comercial, e por outro denunciam a violação dos direitos humanos, por tráfico de órgãos de prisioneiros executados, por não dar autonomia ao Tibete e por ameaçar invadir Taiwan. Pequim por sua parte, não faz guerra fria a Washington, não financia a Al-Qaeda, o Hamas, o Hezzbolah ou as guerrilhas latino-americanas. Mas, sem dúvida, desenvolve laços comerciais com todo o grupo de países adversários dos Estados Unidos.
(*) Isaac Bigio, analista internacional.
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